30 novembro, 2007

Parte 10: Uma Terra por Conquistar

ver parte 9

A vila de Desterro amanheceu em ebulição.
Era grande a movimentação na praça da igreja matriz.
O Capitão de Ordenanças reunia seus homens para iniciar a caminhada até o local onde seriam assentados os casais açorianos, na Costa Leste da ilha de Santa Catarina.

Só iriam os homens feitos e mais experientes, pois muitos eram os perigos a que estariam expostos na jornada.


A ansiedade e a preocupação com um “pito” de alegria, tomava conta daquelas criaturas.
Uma certeza os acompanhava, começavam a caminhada em direção de seus sonhos - a posse das terras prometidas por El Rei.

Tão logo foram feitas as rápidas recomendações do Capitão e do Ordenança do Governador da Capitania de Santa Catarina, se colocou em marcha aquele pequeno exército, de mais de cem homens. Cada qual levando às costas as ferramentas básicas necessárias à derrubada de uma clareira, onde pudessem assentar os primeiros barracos, para morarem enquanto fariam os serviços básicos de desmatamentos e construção das residências de seus familiares. Machados, foices, inchadas, facões, serras, pregos e outros equipamentos, além das armas de fogo e alimentos.

O Capitão Matheus, conduzido por hábeis mateiros acostumados com a região, seguia à frente daquele grupo, atento aos menores detalhes das picadas.

Teriam que se dirigirem, inicialmente para a praia de fora, de lá, seguiriam contando a costa norte da vila, adentrando pela bacia do Itacorubi.

Sempre percorrendo picadas pouco freqüentadas, que em muitos lugares tinham que ser limpas para permitir a passagem dos homens, chegaram finalmente ao alto do morro da lagoa, batizado posteriormente de Conceição.

A viagem até aquele ponto havia consumido uma manhã de caminhada.
Estavam cansados, pois o último trecho do caminho era muito íngreme e de difícil subida.
O que viam compensava todos os esforços e despertavam antecipados sentimentos de felicidades.

Aos seus pés a majestosa lagoa, de águas claras, esverdeadas, em que se avistavam as inúmeras manchas de areias brancas como nunca haviam visto.

Os enormes “combros” de areia que separava a lagoa do mar aberto despertou a imaginação daqueles homens. Cada qual perdido em seus pensamentos, tentando imaginar como seria sua vida e de seus familiares naquele recanto tão lindo e ao mesmo tempo tão assustador, face ao isolamento a que estavam condenados.

Iniciaram a descida do último trecho.
Como diz o ditado “para baixo todo santo ajuda”.
Rapidamente venciam a distância que os separava da lagoa.
Aproximaram-se de uma grande malha de bambú-açú.
Passaram junto a uma grande touceira com muitas folhas soltas.

A cobra jararaca estava dormindo entre as folhas. Foi inadvertidamente pisada pelos que iam à frente. Se encolheu e deu o bote.
Ouviu-se um forte grito de dor.
Os experientes guias de mato, perceberam que uma cobra havia picado um dos homens.

A correria foi geral, uns procurando encontrar a cobra, outros correram para prestar socorro ao ferido, os demais assustados sem saber o que fazer.

Seu Joaquim não perdeu tempo. Pegou uma pequena faca afiada, rasgou a perna da calça, expondo o local onde a cobra havia mordido. Fez um corte no local, chupando sucessivamente o sangue que escorria, cuspindo em porções, até sentir que a maior parte do veneno tinha sido retirada. Pegou uma tira de pano e amarrou fortemente. Solicitou que providenciasse certas ervas, e que encontrasse a cobra, para poder fazer o remédio que curaria o ferido. Precisava com urgência fazer o emplasto para aplicar sobre o ferimento.

O homem picado pela jararaca começou a suar frio, ficando escurecido e muito inchado o local da picada do ofídio.
Fizeram rapidamente uma pequena fogueira colocando uma panela a ferver água.
As ervas formam devidamente amassadas até formar uma pasta. Os olhos da cobra,
Que tinha sido encontrada e morta, foram amassados e colocados junto à poção de ervas.

O curandeiro, de traços índios, pegou um pano limpo, molhou na água quente, passando lentamente na parte ferida. O doente gritava e sentia-se agoniado, a beira do desmaio.
Seu Joaquim o encorajava a se manter acordado.
Ato contínuo aplicou a poção de ervas, massageando a parte ferida.
Finalmente, pegou parte do emplasto, adicionou o olho da cobra bem amassado e aplicou sobre o local da picada. Amarrou bem, e pediu de mantivessem o doente imóvel por mais uma hora aproximadamente.

Colocou a mão espalmada sobre a testa do ferido, ficando nesta posição, imóvel por muito tempo. Quando finalmente levantou a cabeça falou: - vai ficar bom, não corre mais perigo de vida.
Recomendou que o ferido fosse transportado numa maca até a tapera de um velho índio que morava nas redondezas.

As palavras do velho curandeiro devolveu a calma aos assustados açorianos, que não conheciam em suas ilhas a presença de cobras venenosas.

Tinha sido o seu primeiro encontro destes açorianos com o risco de morte na terra que pretendiam ocupar.

Perceberam que muitos desafios teriam ainda que vencer naquele belo, mas selvagem ambiente. Que muitas outras surpresas desagradáveis ainda os aguardaria.

Agradecidos cumprimentavam seu Joaquim por ter realizado aquele verdadeiro milagre. Pois, muitas estórias tinham contado, quase todas, com a morte dos feridos.

O paciente começou a se sentir melhor, recuperando os sentidos, adormecendo em seguida.

O grupo reiniciou a marcha, chegando logo após as margens da lagoa, onde puderam descansar da longa caminhada.

A primeira parte de sua tarefa estava concluída. No período da tarde, após a refeição verificariam qual o melhor local para instalar a sede da freguesia.

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